domingo, 11 de janeiro de 2009

Holocausto tropical

“Limpa com os dedos o nariz, observa espantado o ranho, deita-o fora ou come-o, o teu gesto não terá ligação com o seguinte”: Jean Genet –Infernos

1

Comemos carne de porco no dia de festa
No dia de festa comemos carne de porco
E qual visita guiada ao Vietname da Alma as nossas festas atraem demónios
E eu manifesto habilmente a minha necessidade de escrever sem escrever
Ou seja viver por ti adentro.
A tua cara tapada por um holocausto tropical

2

Fumámos ontem toda a Gaza –
Uma antiga cidade em mortalha de prata
Os anjos estão presos magneticamente a uma qualquer cidade celeste
Compra no LIDL – tem antenas de prata-
Numa das antenas da CNN urina um pobre cigano
Nunca será notícia




Nuno Brito, 2009

Abismo à portuguesa - continuação

Abismo à Portuguesa 2

“Estranha forma de acordar que é estar pronto para dormir”
Manuel Cruz - Tanque

Sonha para mim um abismo dourado
Um abismo à portuguesa
Com toda a sua chama, toda a sua Vida
– Assim que houver abismo e assim que houver portuguesas com os seus cabelos sexys e mãos sexys e que com a sua linha dourada teçam o destino do nosso país.
O mar está fora de moda e nós estamos rodeados de mar…
Ao primeiro marinheiro que chegar ao nosso triste povoado – hei-de apanhá-lo na doca
Fazer-lhe um broche à portuguesa – pô-lo louco – fazê-lo vir-sena minha boca –
dentro de mim A literatura vive
Gosto dos escritores que nunca escreveram, sobretudo esses me são favoráveis
Escritores que como Perseu entram nas melhores pastelarias de Montevideu para comerem bolos dourados e mijarem em urinóis de prata.
Mijam em urinóis de prata a dez quilómetros de Montevideu
quero mais do que a vida
Ontem vieram ter comigo homens tristes, acho que lhes dei confiança sou bem capaz disso
Aliás sou capas de tudo e tenho medo disso - nunca te apaixones por mim o mais provável é encontrares-me numa pastelaria de Berlim a fabricar bolos para os escritores comerem enquanto escrevem nos seus guardanapos isto e aquilo porque tudo é isto e aquilo mas será preciso dizê-lo ? Esses guardanapos hão de servir de alimento aos pássaros que não debicam só migalhas, pelo menos os alemães, mas toda uma literatura, todos os guardanapos à saída da esplanada: toda uma literatura de vanguarda comida, reciclada, escondida, descoberta nos casacos dos mortos -- e eu a rir-me com sarah kane – ela ri-se e nós rimo-nos porque somos pessoas a sério ou temos medo de o ser - E porque temos casacos de marca e isso dá conforto.
Tenho um medo violento – Amo tudo quanto fluí tal Milton – do extremo do corpo ao extremo da alma – a experiência mais profunda – um abismo doce e alucinado à portuguesa –
(Como os teus olhos) para onde todos saltem à doida português atrás de português – do extremo do corpo digo –o mar está fora de moda
Mata agora os nossos marinheiros – o peixe está contaminado – a droga vem do mar – os cadáveres vem do mar – vem do mar a literatura triste do nosso país.
porque é que o mar vai e vem? Porque é que ele não fica quieto– a questão foi levantada por um filósofo


Para Rober Diaz e Vítor Teves
Nuno Brito

sábado, 3 de janeiro de 2009

Uma ideia para José Saramago

Porque não vir uma onda (daquelas que Melville e Conrad viram mesmo) e essa onda entrar por Portugal a dentro e engolir o nosso país com aspecto de uma cara triste, sempre melancólico e obssessivo ficar coberto de água.
Conseguem escapar as gaivotas e os poetas tristes nadam até uma França que espera a submerssão.
Não para apanhar ratos, "tipo anos 60" mas para produzir o modernismo visceral - tipo XXI que do México tal onda tsunami atinge uma costa portuguesa desprotegida mas com boas antenas.



Nuno Brito

quinta-feira, 1 de janeiro de 2009

A Revolução Industrial na Magna Grécia

Ensaio produzido por um sujeito colectivo que é Vítor Esser.


Nossa Senhora de Chernobill, de Minamara,
De Nagasaki e de Guantanamo
Dirijo-me a ti



Nós, três pastorinhos belgas, irmãos da mesma mãe e mesmo pai, crentes no Espírito Santo, fomos procurar emprego numa pequena cidade industrial da fronteira com França, uma pequena cidade onde o sol é tapado pelo fumo das fábricas e onde todos os dias há aparições marianas, o nosso pai vendeu um rebanho para pagar dívidas de jogo, nosso pai bebia muito, a bebida não ajudava muito nosso pai – nós fomos a Chernobill procurar emprego numa central nuclear – vimos lá dentro Diabo a masturbar-se num reactor avariado.


Vou escrever como uma possessa através de ti, através das tuas mãos, sou Diana uma princesa grega, hoje é dia de natal na Magna Grécia, mas eu aqui sentada com todos os semi-deuses da idolatria aguardo o nascimento do cristianismo. Todos os dias naquele monte ali em cima vejo serem crucificados salteadores de túmulos e vendedores de serviços virtuais,
Todos pagam os seus pecados, vejo pedófilos tristes a verem o HI5 das meninas porcas às seis da manhã a olharem para o monitor. O pedófilo a pestanejar masturba-se para dentro de uma terrina, um vaso grego – que Diabo atira contra um muro – Porque o vidro está associado à solidão – porque o vidro separa …
Eu, sentada aqui ao lado de Diabo dito para ti –olho para o espelho e não vejo nada, sou um espelho a olhar para um espelho,

Existiu na Magna Grécia uma fábrica de espelhos em que todos os artífices eram cegos.

EU vi-te no youtube


Vítor Esser

Abismo à Portuguesa

para Vítor Teves


I.



Tenho medo que Jesus não me esporre hoje na boca

não me esporre hoje na boca senhor jesus!

Senhor jesus senhor jesus senhor Jesus

“Escrever é corrigir a vida”[i]

E o esperma que escorre dos lábios de Maria

há de gerar um Semi-Deus Forte

feito para desenhar

uma anunciação a tinta dourada quando houver tinta dourada



Trezentas mil ovelhas caminham rumo a um “abismo à portuguesa”

O decifrador de sinais vê nesta frase uma absurda falta de simbologia,

Ele sabe que eu adoro de uma forma bem primitiva um hitler recém nascido

Com as suas cuequitas apertadas e o rugido do mundo que clama por uma Mão de Ferro



Deliro só de imaginar o seu doce esperma quentinho na minha boca

De Mona a Lisa

De Lenine



Ontem dei a mão a virgílio, Ele guiou-me pela tua boca,

Conduziu-me à máxima experiência humana,

O estremecimento de um holocausto digital

Bem fundo nos teus olhos

A Anunciação



Nuno Brito


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[i] Enrique Vila-Matas.